Behaviorismo Radical X Behaviorismo Metodológico
O Behaviorismo não é a ciência do Comportamento
humano, mas, sim, a filosofia dessa ciência.
o Behaviorismo Radical admite o estudo de
fenômenos como sentimentos e pensamentos (abordados com o conceito de “eventos
privados”); admite, também, a interpretação como método para lidar
cientificamente com problemas dessa ordem e adotar um critério instrumental de
verdade na avaliação de enunciados científicos sobre quaisquer fenômenos.
O primeiro behaviorista explícito foi John B.
Watson, que, em 1913, lançou uma espécie de manifesto chamado A
Psicologia tal como a vê um behaviorista. Como o título mostra, ele não
estava propondo uma nova ciência, mas afirmando que a Psicologia deveria ser
defendida como o estudo do comportamento. Isto pode ter sido um erro
estratégico. A maioria dos psicólogos da época acreditava que seus estudos
estavam voltados para os processos mentais num mundo mental consciente e,
naturalmente, não se sentiam propensos a concordar com Watson. Os primeiros behavioristas
gastaram muito tempo e confundiram um problema central importante ao atacar o
estudo introspectivo da vida mental.
O próprio Watson fez importantes observações
acerca do comportamento instintivo e foi, na verdade, um dos primeiros
etologistas no sentido moderno. Sua nova ciência nascera, por assim dizer,
prematuramente. Dispunha-se de poucos fatos relativos ao comportamento –
particularmente o comportamento humano.
Entre os fatos que dispunha, relativos ao
comportamento, estavam os reflexos e os reflexos condicionados, e Watson
explorou-os ao máximo. Todavia, o reflexo sugeria um tipo de causalidade
mecânica que não era compatível com a concepção que o século XIX tinha de uma
máquina. A mesma impressão fora dada pelo trabalho do filósofo russo Pavlov,
publicado mais ou menos na mesma época, e não foi corrigida pela psicologia do
estímulo-resposta, surgida nas três ou quatro décadas seguintes.
Parecia estar implícito que o comportamento
humano não tinha características distintas. E, para apoiar a sua afirmação de
que a Psicologia era uma ciência, e para preencher o seu livro, ele fez
empréstimos da anatomia e da fisiologia. Pavlov adotou a mesma linha ao
insistir em que seus experimentos sobre o comportamento eram, na realidade,
“uma investigação da atividade fisiológica do córtex cerebral”, embora nenhum
dos dois pudesse apontar qualquer observação direta do sistema nervoso que
esclarecesse o comportamento. Eles também foram forçados a fazer interpretações
apressadas do comportamento complexo; Watson afirmando que o pensamento era
apenas uma fala subvocal e Pavlov, que a linguagem não passava de “um segundo
sistema de sinais”. Nada, ou quase nada, tinha Watson a dizer a respeito de
intenções, propósitos ou criatividade. Ele acentuava a promessa tecnológica de
uma ciência do comportamento, mas seus exemplos não eram incompatíveis com um
controle manipulador.
1. As
Causas do Comportamento
Por que as pessoas se comportam de certa
maneira? Como poderia alguém ser induzido a comportar-se de uma certa forma? Tal
problema poderia ser sempre reduzido a uma questão acerca das causas.
Tendemos a dizer, muitas vezes de modo
precipitado, que se uma coisa se segue a outra, aquela foi provavelmente
causada por esta. A pessoa com a qual estamos mais familiarizados é a nossa
própria pessoa; muitas das coisas que observamos pouco antes de agir ocorrem em
nossos próprios corpos e é fácil tomá-las como causas de nosso comportamento.
Se nos perguntarem por que respondemos com rispidez a um amigo, poderemos
dizer: “Porque me senti irritado”. É verdade que já nos sentíamos irritado
antes de responder, ou então durante a resposta, e por isso achamos que nossa
irritação foi a causa de nossa resposta. Os sentimentos ocorrem no momento
exato para funcionarem como causas do comportamento.
Mas, onde estão esses sentimentos e estados
mentais? De que material são feitos? A resposta tradicional é que estão
situados num mundo que não possui dimensões físicas, chamado mente, e que são
mentais. Mas, como pode um fato mental causar ou ser causado por um fato
físico?
O Estruturalismo
Uma estratégia mais explícita consiste em
abandonar a procura de causas e simplesmente descrever o que as pessoas fazem.
Desta feita, a estrutura ou organização do
comportamento também pode ser estudada como uma função da época ou da idade, como
desenvolvimento do comportamento verbal da criança, ou de suas estratégias para
a solução de problemas, ou na sequência de estágios pelos quais uma pessoa
passa em sua evolução da infância à maturidade. A História destaca as mudanças
que ocorrem no tempo, e se for possível descobrir padrões de desenvolvimento ou
crescimento, então eles também poderão ser úteis na previsão de acontecimentos
futuros.
Evitar o mentalismo (ou psicologismo) recusando-se
a procurar causas é um caminho que tem o seu preço. O estruturalismo e o
desenvolvimentismo não nos dizem por que os costumes são obedecidos, por que as
pessoas votam de uma certa maneira ou apresentam certas atitudes ou traços de
caráter, ou por que línguas diferentes possuem traços diferentes. Nem o tempo nem
a idade podem ser manipulados; só podemos esperar que uma pessoa ou uma cultura
atravessem um determinado período de desenvolvimento.
Em suma, o estruturalismo nos diz como as
pessoas agem, mas esclarece muito pouco por que se comportam desta ou daquela
forma. Não tem resposta para a pergunta com a qual começamos.
O Behaviorismo Metodológico
O problema mentalista pode ser evitado com procuramos
diferentemente as causas físicas anteriores, desviando-nos dos sentimentos ou
estados mentais intermediários. A maneira mais rápida de se fazer isto consiste
em limitarmo-nos àquilo que um dos primeiros behavioristas, Max Meyer, chamou
de “a psicologia do outro”: considerar apenas aqueles fatos que podem ser
objetivamente observados no comportamento de alguém em relação com a sua história
ambiental prévia. Se todas as ligações são lícitas, mas se perde nada por desconsiderar
uma ligação supostamente imaterial.
É claro que não há nada de novo em tentar
prever e controlar o comportamento por meio da observação e da manipulação de
acontecimentos públicos antecedentes. Os estruturalistas e os
desenvolvimentistas não ignoraram inteiramente a história de seus sujeitos e os
historiadores e biógrafos têm explorado as influências do clima, da cultura,
das pessoas e dos incidentes. Muitos têm usado técnicas práticas de predição do
comportamento. Todavia, por muitos séculos, fizeram-se poucas investigações
sistemáticas acerca do papel desempenhado pelo ambiente físico, embora centenas
de volumes altamente técnicos sobre a compreensão humana e a vida da mente
tenham sido escritos. Um programa behaviorista metodológico só se tornou
plausível quando se começou a fazer progresso na observação científica do
comportamento, pois só então tornou-se possível superar a pesquisa da investigação
do papel desempenhado pelo ambiente.
As explicações mentalistas acalmam a alma e
curiosidade e paralisam a pesquisa. É tão mais fácil observar os sentimentos e
estados mentais, num momento e num lugar, que fazem parecer sejam elas as
causas, que não nos sentimos inclinados a prosseguir na investigação. Uma vez,
porém, que se começa a estudar o ambiente, sua importância não pode mais ser
negada.
Poder-se-ia considerar o behaviorismo
metodológico como uma versão psicológica do positivismo ou do operacionismo
lógico, mas estes se preocupam com questões diferentes. O positivismo ou
operacionismo lógico sustenta que, uma vez que dois observadores não podem
controlar acerca do que ocorre no mundo da mente, então, do ponto de vista da
ciência física, os acontecimentos mentais são “inobserváveis”; não pode haver
verdade por acordo e devemos abandonar o exame dos fatos mentais, voltando-nos antes
para a maneira por que são estudados. Não podemos medir sensações e percepções enquanto
tais, mas podemos medir a capacidade que uma pessoa tem de discriminar
estímulos; assim, pode-se reduzir o conceito de sensação ou de percepção à
operação de discriminação.
Os positivistas lógicos têm sua própria versão
do que seja “o outro”. Argumentam que um autômato que se comportasse exatamente
como uma pessoa, respondendo da mesma forma aos estímulos, alterando seu
comportamento em razão das mesmas operações, seria indiscernível de uma pessoa
real, ainda que não tivessem sentimentos, sensações ou ideias. Se tal autômato
pudesse ser construído, ele provaria que nenhuma das supostas manifestações da
vida mental requer uma explicação mentalista.
O behaviorismo metodológico foi bem-sucedido em
relação a seus próprios objetivos. Descartou-se de muitos problemas suscitados
pelo mentalismo, ficando livre para trabalhar em seus próprios projetos, sem
digressões filosóficas. Com voltar a atenção para os antecedentes genéticos e
ambientais, contrabalançou ele uma justificada concentração na vida interior. Libertou-nos
para os estudos do comportamento das espécies inferiores, onde a introspecção
não era exequível, e para a exploração das semelhanças e diferenças entre Homem
e as outras espécies.
Mas restava ainda um problema. A maioria dos
behaviorismos metodológicos admitia a existência dos fatos mentais, ao mesmo
tempo que os excluía de considerações. A concepção de que um mundo puramente
físico poderias ser autossuficiente fora sugerido séculos atrás, na doutrina do
paralelismo psicofísico, a qual sustentava a existência de dois mundos – um
mental e outro material – e de que nenhum deles exercia qualquer efeito sobre o
outro. A demonstração freudiana do inconsciente, no qual uma consciência dos
sentimentos ou estados mentais parecia desnecessária, apontava na mesma
direção.
O Behaviorismo Radical
A afirmação de que os behavioristas negam a
existência de sentimentos, sensações, ideias e outros traços da vida mental
precisa ser bem esclarecida. O Behaviorismo Metodológico (Watson) e algumas
versões do positivismo lógico excluíam os acontecimentos privados porque não
era possível um acordo público acerca de sua validade, a introspecção não podia
ser aceita como uma prática científica e a psicologia de gente como Wilhelm
Wundt e Edward B. Titchener era atacada por isso.
O Behaviorismo Radical, todavia, adota uma
linha diferente. Não nega a possibilidade de auto-observação ou do
autoconhecimento a sua possível utilidade, mas questiona a natureza daquilo que
é sentido ou observado e, portanto, conhecido. Restaura a introspecção, mas não
aquilo que os filósofos e os psicólogos introspectivos acreditavam “esperar”, e
suscita o problema de quanto de nosso corpo podemos realmente observar.
O Mentalismo, ao fornecer uma aparente explicação
alternativa, mantinha a atenção afastada dos acontecimentos externos
antecedentes que podiam explicar o comportamento. O Behaviorismo Metodológico fez
exatamente o contrário: com haver-se exclusivamente com os acontecimentos
externos antecedentes, desviou a atenção da auto-observação e do
autoconhecimento. O Behaviorismo Radical restabelece um certo tipo de
equilíbrio. Não insiste na verdade por consenso e pode, por isso, considerar os
acontecimentos ocorridos no mundo privado dentro da pele. Não considera tais
acontecimentos inobserváveis e não descarta como subjetivos. Simplesmente
questiona a natureza do objeto observado e a fidedignidade das observações.
A posição pode ser assim exposta: o que é sentido
ou introspectivamente observado não é nenhum mundo imaterial da consciência, da
mente ou da vida mental, mas o próprio corpo do observador. Isto não significa,
como mostrarei mais tarde, que a introspecção seja uma espécie de pesquisa
fisiológica, mas tampouco (e este é o cerne do argumento) significa que o que é
sentido introspectivamente observado seja a causa do comportamento. Um
organismo comporta-se de determinada maneira devido à sua estrutura atual, mas
a maior parte disso está fora do alcance da introspecção. De momento, devemos contentar-nos,
como insiste o behaviorismo metodológico, com a história genética do ambiente
da pessoa. O que observamos introspectivamente são certos produtos colaterais
dessas histórias.
Nosso conhecimento cada vez maior do controle
exercido pelo meio ambiente torna possível examinar o efeito do mundo dentro da
pela e a natureza do autoconhecimento. Possibilita também interpretar uma ampla
gama d expressões mentalistas. Por exemplo, podemos considerar aqueles traços
de comportamento que levam as pessoas a falar de um ato de vontade, de um senso
de propósito, da experiência como algo distinto da realidade, de ideias inatas
ou adquiridas, de lembranças, de significados, do conhecimento pessoal do
cientista, e de centenas de outras coisas e acontecimentos mentalistas. Alguns
podem ser “traduzidos em comportamentos”; outros, descartados como
desnecessários ou sem sentido.
Dessa forma, remediamos o maior dano produzido
pelo mentalismo. Quando aquilo que uma pessoa faz é atribuído a algo que lhe
ocorre no íntimo, cessa a investigação. Por que explicar a explicação? Há 2500
anos, as pessoas se têm preocupado com os sentimentos e a vida mental, mas só
recentemente se revelou algum interesse por uma análise mais precisa do papel
do meio. A ignorância desse papel levou, em primeiro lugar, às ficções mentais
e foi perpetuada pelas práticas explicativas às quais ela deu origem.
SKINNER, Burrhus Frederic. Sobre o Behaviorismo. Tradução de Maria da Penha Villalobos. 10 ed. - São Paulo. Cultrix, 2006, P. 07 -22.
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